Num só dia, conseguia quebrar a tesoura de mamãe, arrancar os cabelos de minha boneca ao trepar em uma árvore com ela ao colo, e, finalmente, quebrar um prato valioso, ao ajudar a enxugar a louça.
Depois de cada um desses desastres, corria para minha mãe e dizia depressa:
- Desculpe, mamãe!
E estava crente de que, pronunciando essa senha mágica, obtinha completa absolvição.
No dia seguinte a uma dessas estrepolias, aconteceu-me derramar café na toalha da mesa.
- Desculpe, mamãe! disse eu logo.
Mas mamãe, sorrindo, tomou uma toalha e enrolou-a em minha cabeça, como um turbante. E pôs-me na mão uma varinha que, propositadamente, deixara por perto. E disse bem humorada:
- Você agora é um mágico, com uma varinha de condão. Diga as palavras mágicas: “Desculpe, mamãe!”, dez vezes, sobre essa mancha de café.
Eu repeti as palavras enquanto o resto da família me olhava fingindo seriedade e sopitando um acesso de riso.
Quando terminei, tomada de intensa curiosidade, perguntei a minha mãe:
- E a mancha? Desapareceu?
- Não! ela respondeu com naturalidade.
Caindo em mim, comentei chorando de decepção:
- E não podia mesmo desaparecer, embora eu dissesse mil vezes “Desculpe!”
- Então, disse mamãe, isso significa que “Desculpe!” não é uma palavra mágica. Não é interessante? Um “Desculpe!” não pode fazer desaparecer, em dois minutos, uma mancha de café que a gente, com apenas dois segundos de atenção, pode evitar. Bem, você quer que eu encha sua xícara outra vez?
E minha mãe não precisou, nunca mais, repreender-me por qualquer estouvamento.
Quantas vezes eu penso ter esquecido a lição, volta-me à lembrança aquele turbante de toalha e a varinha de condão improvisada.
Fonte: E, para o resto da vida ..., de Wallace Leal V. Rodrigues
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