Rita Foelker
Natalino é um
espírito alegre, danado de esperto, que adora passear pelo mundo afora.
Ele se diverte com o
fato de aprontar mil e uma travessuras sem jamais ser visto por alguém.
Mas as travessuras de
Natalino não são travessuras de chatear, nem de aborrecer, nem de estragar o
que é dos outros. São brincadeiras sem maldade, que ele faz so para as pessoas
ficarem contentes e acharem a vida mais divertida.
E como nem so de
brincadeiras vive um Espírito, ele também costuma dar inspirações o tempo todo.
Engraçado! Ele acha
que na época do Natal as suas sugestões dão mais resultados. Por isso, trabalha
mais em dezembro que nos outros meses do ano...
Natalino vai
flutuando pelas ruas observando tudo e todos e, quando encontra oportunidade –
ZAPT! Chega mais perto de alguém e lhe sopra um pensamentinho:
- Sorria!
- Diga “olá” ao seu
vizinho!
Natalino vinha vindo
meio distraído, quando viu dois garotinhos parados na calçada olhando através
de uma vitrine.
Parou ao lado das
crianças descalças e sujinhas e logo descobriu o que estava acontecendo.
Dentro da lanchonete,
mãe e filha tomavam sorvete.
Ao contrário dos
dois, zonzos por causa da fome. Natalino percebeu que, lá dentro, o gerente
mandou um rapaz despachar os meninos dali, antes que incomodassem os clientes.
Mas Natalino era
espírito e podia agir mais depressa. Atravessou o vidro e disse à menina:
- Está vendo
aqueles dois? Não comem nada desde
ontem.
Ao receber a
inspiração, ela olhou para a janela e disse à mãe:
- Mamãe, aqueles
meninos devem estar com fome. Não podemos comprar uns lanches pra eles?
Impressionada com a
sensibilidade da filha para com o sofrimento alheio, a mãe viu que o moço se aproximava
( e com que cara, gesticulando para os moleques!) e 0 chamou:
- Ei, rapaz! Venha
aqui, por favor!...
O empregado da
lanchonete olhou para o gerente, e o gerente o mandou atender à freguesa. A mãe
da menina continuou:
- Prepare dois
hambúrgueres, duas porções da batata-frita, e leve para os dois meninos lá
fora. Coloque na minha conta, sim?
O moço não teve outro
remédio, senão fazer a vontade da freguesa.
Os meninos
arregalaram os olhos com o tamanho dos sanduiches e foram embora, engolindo
quase sem mastigar.
Satisfeito, Natalino
saiu à procura de mais corações onde plantar amor e compreensão. Amava o tempo
de Natal! Luzes piscando nos pinheirinhos. A cidade enfeitada. O movimento.
Mas Natalino não se
esquecia dos lugares distantes, da periferia e da favela. Também circulava
entre os barracos, pelas ruelas estreitas onde, naquele momento, os meninos
tentavam fabricar revolveres de sabão para brincar de tiroteio.
-Por que você não faz um Jesus? – disse Natalino a um
deles.
E ajudou um pouco de
modo que, raspa daqui, raspa de lá com o canivetinho, o garoto esculpiu a
figura de um bebezinho num bercinho de palha.
- Olha o que eu fiz!
- Jesus
-Jesus?
-Aquele que disse
venham a mim as criancinhas!
-Bah! Quem quer saber
de crianças como nós? – comentou um deles, com jeito de mais velho da turma.
-Ele queria – disse
Natalino ao menino
-Ele queria – disse o
menino aos companheiros.
Eu também vou fazer
um Jesus para minha mãe.Ela vai gostar – falou um dos meninos, transformando
seu brinquedo numa esculturinha de Jesus menino.
-É boa idéia! Eu não
tinha nada pra dar de Natal à minha mãe!...
Todos os garotos
fizeram um Jesus, do jeito que tinham na cabeça.
Mais criança ou mais
adulto.
Mais alegre ou mais triste,
etc.
Natalino deixou os
garotos trabalhando e foi a uma linda mansão onde morava um velho solitário.
Ele estava triste, como acontecia em todo final de ano. Tinha lagrimas nos
olhos, enquanto olhava para uma fotografia antiga onde um grupo de rapazes e
moças festejava sua formatura.
Natalino logo
entendeu que o que ele tinha era saudade das
festas e dos amigos da juventude!
Quando ele adormeceu
na poltrona, Natalino aproveitou para
conversar com ele em sonho:
-Por que o senhor
está chorando?
-Porque semana que
vem é natal, outro natal que certamente passarei só.
-O Senhor está enganado. Espere aí, que eu já volto!
Natalino saiu por um instante. Lembrava-se de alguns daqueles rostos
que estavam no retrato. Era gente que andava, agora, pelo Mundo Espiritual.
Ele trouxe duas mulheres e um homem, companheiros de juventude do homem
triste.
- O que vocês fazem, lá onde moram? – perguntou-lhes o velho.
-Procuramos ser uteis e servir sempre. Assim, não temos tempo para a
tristeza.
Mas vocês são... é... Espíritos. Eu vivo na Terra e só as lembranças
são minhas companheiras, por mais tristes que sejam...
-Você não precisa ficar sozinho, se não quiser – disse uma das mulheres
do grupo.
Eu trabalho, por concessão de Deus, numa equipe de amparo espiritual ao
orfanato aí, da rua de baixo. Eles vão passar um Natal “magrinho” devido a sérios problemas financeiros. Por que você
não vai até lá e oferece alguma ajuda?
Aí Natalino entrou na conversa:
-Por que o senhor também não faz uma festa para as crianças, aproveita
e passa o Natal com elas?
O velho gostou tanto da idéia que voltou depressa para o seu corpo , na cadeira da biblioteca,
e telefonou para a diretora do
orfanato, perguntando se aceitariam uma doação e se não gostariam de organizar
uma festa de Natal.
Quando desligou o telefone, ele nem sabia direito por que tinha feito
aquilo, pois nem sempre recordamos o que acontece enquanto nosso corpo dorme. O
que ele sabia é que, agora, sentia-se muito melhor que antes. Tanto, que saiu
para o jardim, assoviando uma musiquinha...
Enfim, missão cumprida.
Natalino achou que seu dia havia sido bastante produtivo e quis
descansar um pouco. Voltou para as ruas
do centro, pensando em espalhar apenas mais um pouquinho de ternura aqui, um
pouco de fé ali, uma esperançazinha mais adiante, e já ia entrando num shopping
quando avistou uma linda loja de brinquedos, imensa, do outro lado da rua.
Ele gostava tanto de brinquedos! (já estava até pensando em ser um
destes artesãos que fazem brinquedos de madeira, quando nascesse de novo na
terra).
E aquela loja era o máximo!! A vitrine tinha um Papai Noel em tamanho
natural, com um trenó cheio de presentes, puxado por oito renas de pelúcia.
Bolinhas de isopor caíam como neve de verdade. Havia guirlandas com luzes e
sinos e, lá de dentro, vinha o som de uma
usica em inglês: Jingle bels!
Natalino não resistiu e foi ver de perto as bicicletas, os ”games”, os
quebra-cabeças e tudo o mais.
Uma família de aparência humilde olhava as prateleiras.
A menina queria porque queria a boneca de tecido que virava um vasinho
de flor, e o irmão examinava um skate.
Os pais tentavam explicar que, naquele ano, não seria possível comprar
presentes. O pai disse ao garoto que sabia fazer um carrinho de rolimã, e que
era muito divertido brincar com ele. A mãe que costurava bem prometeu tentar
fazer uma boneca parecida, com uns retalhos que tinha guardado.
Mas eu quero ESTA, ó...
-No seu aniversario, querida, quem sabe...
-Mas eu quero HOJE!
-Meu bem – explicou a mãe – eu adoraria poder lhe dar todas as bonecas
do mundo...
-Não quero todas, só quero ESTA! Buááá´!
Natalino achou que era hora de entrar em ação. Ele disse:
-Não chore! Seus pais não podem realmente comprar a boneca.
-EU QUERO!!! – Gritava a menina.
O pai já olhava para os lados, pra ver se não tinha ninguém assistindo
à cena. E Natalino insistiu:
-Neste Natal muitas crianças não terão nem o que comer. A situação de
sua família, felizmente, é bem melhor, e....
-EU QUERO!!!!Buááá!
Natalino não sabia o que fazer, para tocar o coração da menina.
Então ele foi saindo da loja
triste, reconhecendo que não se pode acertar sempre.
Quando isso acontece, o Espírito Natalino pensa até em desistir de sua
missão de fazer as pessoas viverem o verdadeiro sentido do Natal.
Mas ainda existe muita gente que ouve o que ele diz, recebe no coração
a sua mensagem de paz e alegria e transforma o Natal num tempo de fraternidade
e amor. E é somente por causa destas pessoas que Natalino continua dizendo:
-Amai o próximo!
-Sede bons!
-Perdoai as ofensas!
-Lembrai-vos de Jesus!
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